quarta-feira, 1 de outubro de 2008

CAPITU OHOS QUE O DIABO LHE DEU

Uma das protagonistas mais lembradas e misteriosas da literatura brasileira, Capitu assim como era chamada por seu autor, traz em sua figura um enigma ainda não desvendado, mas com grandes especulações a respeito do mistério que está contido em seus olhos de cigana oblíqua.
Capitu tem uma história um pouco diferente das suas antecessoras Ema e Luísa, embora seja uma protagonista de um romance também Realista, Capitu é uma típica mulher brasileira de classe pobre, sem estudos, que deixou a vida modesta para tornar-se esposa de Bento Santiago, um advogado que se aproveitou da profissão para fazer conclusões a respeito da fidelidade da esposa.
“Quatorze anos, entretanto parecia ter 17 de tão alta e encorpada. Olhos claros e grandes, cabelos grossos amarrados com duas tranças descendo-lhe pelas costas. Tinha o nariz reto e comprido, boca fina e as mãos cheiravam a sabões comuns devido ao trabalho árduo. Trajava roupas simples, um vestido de chita e sapatos de duraque velhos”. (ASSIS, 2003, p. 21). Não demonstrava nenhum luxo com sua vestimenta, pois era filha de um funcionário público, mas mesmo assim possuía uma beleza imprescindível. Inteligente apesar de não ter tido condições de estudar, demonstrava sempre aguçada curiosidade em aprender coisas novas e um espírito de pesquisadora.
Desde a infância tinha grande amizade e apreço pelo amigo Bentinho, sempre ficavam de segredinhos metidos pelos cantos jogando gamão. A única coisa que os separava era a parede da casa de Bentinho, mas mesmo assim estavam sempre juntos nas travessuras de crianças. Dona Glória, a mãe de Bentinho, tinha grande consideração por Capitu, não via nenhuma maldade na amizade dos dois, ao contrário de José Dias, o agregado, achara. Capitu sempre a acompanhava à missa e demonstrava ser muito devota, talvez por essa razão houvesse cativado a simpatia da mãe de Bento Santiago.
Ainda que fosse uma adolescente de apenas 14 anos, demonstrava ser ardilosa, sempre tomava o comando das coisas por Bentinho. Possuía idéias atrevidas para sua idade, porém quando as colocava em prática, pareciam mais hábeis e ardilosas, e com seu jeito esperto sempre alcançava o fim proposto.
Quando falavam em seu nome na casa de Bento, todos prestavam muita atenção, como se ela fosse uma pessoa má. Não se incomodava com a opinião dos outros, dizia tudo o que lhe vinha à cabeça. Com seu jeito decidido e espontâneo de ser, quando alguma coisa lhe desagradava apenas dava um sorriso sarcástico e refletia, como se estivesse maquinando algo. Ninguém tinha domínio sobre ela:

A paixão e o carinho de Capitu por Bentinho aumentavam intensamente virando a amizade de criança numa paixão ardente, fazendo com que Capitolina concentrasse toda a sua atenção em um único propósito, o de impedir que Bentinho fosse para o seminário. Preferia tudo, menos que o amigo fosse embora. Não sabendo como impedir para que o amado não fosse ao seminário, Capitu aconselha o a pedir ajuda ao amigo José Dias. Quando passava pela cabeça dela que Bento poderia ir embora, ela ficava furiosa, com raiva, chamando dona Glória com impropérios. Beata! Carola! Papa missas! (ASSIS, 2003, p. 25).

O agregado, José dias não simpatizava com Capitu, achava-a desmiolada e misteriosa, devido o semblante misterioso do seu caráter. Estava acima de qualquer homem, até mesmo de Bento Santiago. Ela era mais mulher do que ele homem. Tinha olhos de cigana oblíqua e dissimulada, porque nunca olhava nos olhos das pessoas, mas por baixo. O olhos de ressaca. Capitu tinha os olhos de ressaca. Trazia um fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia em dias de ressaca. (ASSIS, 2003, p.51).
Quando Bentinho a olhava fixamente dentro de seus olhos sentia-se arrastado pelas outras partes do corpo de Capitu, pois aquelas pupilas enormes puxavam a atenção de qualquer um pelo infinito mistério que havia contido em seus olhos. Seus beijos davam sensação de vertigem atiçando a vontade de experimentar mais o gosto de seus lábios. Com gestos inesperados, pousando sua boca na de Bento, despertava-lhe o desejo de paixão.
Curiosa como só ela, Capitu sempre queria saber o porquê das coisas, fazia muitas perguntas muitas vezes inexplicáveis. Vivia lendo, interessava-se pelas figuras das ruínas, queria saber sobre a história, o que acontecia nos livros, a origem dos nomes ditos populares, tudo era motivo de curiosidade para ela. Uma vez quis aprender latim, apenas para contrariar o padre que disse a ela que latim não era língua para moças aprender. Até em aprender inglês Capitu se interessava. Adorava tocar piano da casa de Bentinho, o piano e a leitura propiciavam lhe deleite.
Capitolina, como quem não deseja nada, consegue finalmente casar com Bento, livrando-o da promessa de dona Glória, graças as suas artimanhas e a sua aguçada inteligência em maquinar as coisas. Os dois se casam e Capitu torna-se a esposa de Bento Santiago. Ela adorava sair às ruas de mãos dada com Bentinho afim de que a sociedade visse que aquela moça de família pobre estava casada com um homem rico.
A amizade entre Capitu[1] e Escobar, amigo de Bento do tempo do seminário aumenta, despertando certo ciúme em Bento Santiago. Capitu tem um filho e em homenagem ao amigo, batiza o menino de Ezequiel Escobar. Cada vez mais Bentinho fica atormentado com seu ciúme doentio, da amizade entre Capitu e Escobar. O ciúme de Bentinho é tão forte que após a morte de Escobar, ele levanta semelhanças entre o filho Escobar, com o melhor amigo, achando que Capitu o traiu. A dúvida que atormentou Bentinho fez com que ele mandasse Capitu e o filho para a Europa, ficando sozinho em seus pensamentos. Embora Capitu tenha sido julgada, ela não esquece Bento e o seu amor que sentira por ele. [2] O ciúme de Bento Santiago por Capitu, se iguala ao de Otelo por Desdêmona, só que Bentinho não chega ao absurdo de querer matar Capitu como Otelo.
[1] CAPITU: Forma latina de Capitolium, por sua vez, provém de Caput, ‘cabeça’. Daí considerar-se a base substantiva de formação do nome do personagem em questão e, desse modo, seu papel determinado. (Câmara, no site www.filologia.org.br/anais%20iv/civ07